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Stadium Arcadium – Muito além do By the way by camiloaggio
setembro 21, 2006, 6:20 pm
Filed under: Música

 Muito Além do By the way, por Camilo O. Aggio

Mais de 25 anos de carreira, 9 álbuns de estúdio gravados, altos e baixos na carreira e um manancial de histórias envolvendo de drogas até o maior rodízio de integrantes da história do Rock fizeram dos Red Hot Chili Peppers uma das bandas mais longevas e importantes do Rock nas últimas duas décadas.

Anos de 2006: os Peppers estão de volta com um feito inédito na carreira: Stadium Arcadium, o primeiro álbum duplo da banda. Para entender  o que esse álbum significa para a carreira dos Peppers, é fundamental saber um pouco da história recente da banda.

Stadium Arcadium é o terceiro álbum da banda depois da volta do guitarrista John Frusciante, sendo precedido por By the way (2002) e Californication (1999). Frusciante foi um dos grandes responsáveis pelos dois maiores e melhores álbuns dos Peppers: Mother´s Milk (1989) e Blood Sugar Sex Magic (1991) (Pra quem não sabe, foi desse álbum que saíram as canções “Give it away” e “Under the Bridge”), sendo o segundo, sem meias palavras, um dos grandes álbuns da história do rock mundial, e responsável por levar os Peppers ao estatuto de celebridades e grandes referências da música pop. Embora tenham criado muitos clichês, os Peppers também foram vítimas de alguns bastante comuns: Frusciante, então com 22 anos, não agüentou o estrelato e o ritmo da turnê do Blood Sugar, em meados de 1992, e resolveu abandonar o barco, deixando os outros integrantes a ver navios no Japão.

Depois da ruptura, as coisas não pararam para nenhum dos dois lados. Enquanto Frusciante se afundava na heroína e fazia álbuns experimentais de gosto bastante duvidoso (principalmente no que diz respeito às letras), os Peppers, depois de muito rodar, contrataram Dave Navarro, ex guitarrista da banda californiana Janes Adiction, e fizeram um álbum quase sofrível: One Hot Minute (1995), que chegou a emplacar o hit Aeroplane nas rádios e na Mtv. Não agradou aos fãs e pelo que parece, nem a banda. Depois de uma pequena turnê, incluindo o Woodstock 2, Dave Navarro abandonou os Peppers , que se viu em um grande dilema, descrito da seguinte forma pelo baixista Flea: “A banda só funcionaria novamente se o John voltasse”. E foi o que aconteceu. John recebeu o convite, passou a tratar da sua dependência pela heroína e se juntou ao grupo. Para a felicidade geral da nação.

Só que a volta não foi lá o que se esperava. Aqueles fãs que estavam sedentos por um novo Blood Sugar Sex Magic tiveram que se contentar com uma “quase outra banda”. Ao invés de “If you have do Ask” e “Funky Monks” os Peppers deram “Scar Tissue” e “Get on top” e ao invés das baladas como  “I could have lied” e “Under the Bridge”, os fãs tiveram que ouvir (arghh!!!) “Otherside” e “Porcelain”. Embora não tenha agradado muitos dois fãs que já acompanhavam a  carreira do grupo, Californication fez com que os Peppers chegassem ao conhecimento de um outro público, mais “pop”, digamos, mais ecléticos, traduzindo: aqueles que dizem que “gostam de tudo”. Mas, para os tenros fãs, Californication só era o prenúncio do fim (da picada), à propósito: By the Way, o oitavo álbum de estúdio do grupo. A banda resolveu extrapolar no poder de compor baladas que matariam um diabético em frações de segundos. By the way, com elementos do Joy Division, podreiras pop dos anos 80, com direito a sintetizadores em algumas faixas, os Peppers fizeram o pior álbum de sua carreira.

Mas, não é a toa que esta banda foi um ícone dos anos 90 e até hoje influencia e é respeitada pela meio musical. Stadium Arcadium é o grande choque que os antigos fãs da banda precisavam para se reanimar. Nesse que é o nono álbum da carreira, composto por dois discos,  Júpiter e Mars, contendo 14 faixas cada um, os Peppers mostram que ainda sabem compor e tocar como nos velhos tempos. Stadium Arcadium não chega a ser um, digamos, álbum à altura do Mother´s Milk, Blood Sugar, ou mesmo Uplift Mofo Party Plan (1987), mas não se cansa de fazer referência a esses trabalhos.

Júpiter, que inclusive tem como faixa de abertura o hit Dani Califórnia, é o melhor dentre os dois. Os Peppers oferecem levadas funk´s não mais como “Get on Top” de Californication, mas como “Backwoods” do Uplift Mofo Party Plan, ou “Apache Rose Peacock” do Blood Sugar sex magic. A cozinha da banda, composta por Chad e Flea retomam os velhos grooves, com linhas pegajosas e poderosas, e John Frusciante, FINALMENTE,  volta a ser um guitarrista, lembrando a “pegada”, os riff´s e solos que tanto caracterizaram seu estilo quando tinha apenas 19 anos e estava entrando para a banda.

Mas não é só de flores que o Stadium Arcadium é composto. Muito das influências tardias trazidas por Frusciante e que entraram com peso nos dois álbuns anteriores da banda, ainda podem ser encontrados nessas novas composições. Mas não sozinhas, e aí que entra a questão: funciona na maioria das vezes. Algumas faixas de Mars, e muitas de Júpiter, intercalam versos e pontes densas, de sonoridades mais “difíceis”, com refrões palatáveis, digno dos anos 80.

Por ser um álbum duplo, com 28 composições, seria difícil que os Peppers fizessem um álbum tão conciso e de rara qualidade como o Blood Sugar Sex Magik. Algumas músicas não funcionam nem como composições solitárias (singles), muito menos como parte do conjunto (álbum), mas Stadium Arcadium tem pelo menos 80% das suas composições com um nível de qualidade que os Peppers não atingiam há mais de 10 anos, e com um vigor que poucas bandas “quarentonas” ainda conseguem manter

Stadium Arcadium é a prova do poder criativo que os Peppers tinham deixado adormecido no processo de composição dos dois últimos álbuns. É também a prova de que estão olhando para trás, para além, muito além do By The Way. Bom para os fãs.

 

 

Faixa por faixa

 

Jupiter

 

 

Dani Califórnia – Boa abertura. Um rock com uma levada típica funk dos Peppers. Tem uma pé nos anos 80, com uma refrão pegajoso e um solo a lá Hendrix.

 

Snow (Hey Oh) – Uma balada do Californication, mas com mais densidade, mais propriedade, com um arranjo mais Rock and Roll

 

Charlie – Inegável a semelhança com o Uplift Mofo . Parece até que o Hillel Slovak apareceu pra fazer os versos e deixou o refrão com o novo Frusciante. Lembra suas antigas influências, como o Funkadelic, com riff´s super reverberados que lembram Maggot Brain.

 

Stadium Arcadium – Balada com melodia meladíssima, lembra refrões oitocentistas. Um pequeno sintetizador por trás, a confuncidiria com uma composição do Erasure

 

Hump de Bump – Os peppers não usam o rap como usaram no Blood sugar. É perceptível que eles tentam chegar no Blood Sugar, mas  Hump the Bump é inevitável comparar com elementos do Hip Hop. A equação: Verso = Funk legítimo; Refrão: quase Black Eyed Peãs. Diverte. Se Beavis estivesse vivo diria: “Essa música me dá vontade de rebolar”.

 

She´s 18  – Uá, uá, Hendrix –– Bom instrumental, porém Kiedis peca na melodia vocal. O instrumental pedia um refrão mais intenso, Kiedis acaba suavizando.

 

Cheeta – Balada, violão de aço que está mais para a última faixa de Californication Road Trippin  do que para I could Have lied. Mais californication do que Blood Sugar. É bonita, tem um refrão condizente com o que a melodia pede, se redime pela faixa acima.

 

Torture me – Doida. Rock impulsivo, uma linha de baixo pesada, com uma guitarra correndo desesperada ao lado. É esquizofrênica, tem um verso punk e um refrão “mais anos 80 impossível”, pontes com trompetes arranhando uma linha meio Ska. A letra é meio piegas, e ainda cita  “nossas crianças brasileiras”:

 

Strip my mind – Frusciante abrindo nos vocais, longe e fazendo sons, ou dizendo algo ininteligível. Solo com notas duplicadas, que lembra uma das bandas dos anos 80 que os Peppers representam no clipe de Dani Califórnia, cafona até não poder mais. A música parece um amontoado de clichês, tudo previsível. Embalada, pronta para beber. Não convence.

 

Michigan – Anthony volta a sua terra natal, com riff´s U2 acompanhando-o nos versos e no refrão. Boa canção, sem muita firúla, que servem como uma boa trilha para Anthony relatar o que observa por Michigan.

 

Warlocks – Base funkiada como pretexto para Kiedis despejar sua letra. Funciona.

 

C´mon girl – Muito agitada, porém nada surpreendente. A música tem uma lógica muita parecida com muitas do Californication, Flea mantém uma linha de baixo frenética ao longo da canção, como em Parallel Universe, com direito a uma risadinha diabólica ao final, algo como Thriller do velho Michael Jackson.

 

Wet Sand – Bonita baladinha. Um pequeno órgão faz um melodia que lembra, muito de longe, Breaking the girl, ao menos na atmosfera. A canção, embora uma baladinha bonita relativamente comum, tem quebradas de ritmo e mudanças de timbre arriscadas, mas bem sucedidas. Convence, é bonita.

 

Hey – Anthony manda bem no vocal, sabendo ser impulsivo e suave conforme a música pede. Frusciante arrisca bem um solo bluseiro, talvez o primeiro dentro dos Peppers, triste como pede o termo, mas com uma pegada hendrexiana. Fecha o primeiro álbum com delicadeza e classe.

 

 

Mars

 

Desecration Smile – Abre com classe o segundo disco. Pela primeira vez em mais de 20 anos de carreira os Peppers compõe uma música com uma referência tão direta às baladas melancólicas do Neil Young. Um pouco do som novecentista de Seattle também pode ser encontrado. Não é à toa…

 

Early Eighties – Verso com levada funk, que faz lembrar um pouco do som do álbum Freak Styley (Álbum dos Peppers de 85,  produzido por George Clinton, mentor do Parliament /Funkadelic) com um refrão importado diretamente do Californication.

 

Hard To Concentrate – Anthony Kiedis adota um tom grave para recitar suas letras por cima de um baixo digno de um The Cure.

 

21st Center – Flea continua lembrando seus velhos baixos que remontam ao auto-intitulado primeiro álbum dos Peppers,  enquanto Kiedis descobre a razão para o século 21……

 

She Looks to Me – Balada fugaz, passa quase despercebida, porém muito fácil de ouvir. Os corações mais moles encontraram amparo nessa faixa.

 

Readymade – Riff de guitarra pesado, seco mas com levada, a lá Tom Morello (Rage against the Machine e Audioslave). Mas, justiça seja feita, Morello veio depois, já inspirado pelos Peppers, mesmo tendo criado um estilo…

A faixa funde momentos bastante distintos, ora lembrando Led Zeppelin, ora Nirvana…os Peppers exercitam seu pode de fusão. Marca que os registrou no mundo da música.

 

If  Sem definição. Uma balada que quebra o ritmo que o disco vinha definindo. Poderia ter ficado no “se” mesmo….

 

Made you feel Better – Imaginem uma canção punk rock. Agora diminua a velocidade dessa canção, depois pare bem na entrada do New wave, não avance a porta: Essa é Made you feel Better.

 

Animal Bar – Ao contrário de If, esta balada tem função estrutural. Serve como uma boa ponte. Não quebra o percurso do disco.

 

So much i – Anthony Kiedis toma as rédeas nesta faixa e faz uma melodia vocal até melhor do que a  canção pedia. A empolgação do vocalista dos Peppers é imperdível.

 

Storm in a teacup – Funk poderoso com uma refrão The  Breeders. Longe de ser uma um mísero “storm in a teacup”

 

We Believe – Guittarras que lembram Santana na sua fase (nada boa) atual. Mars poderia ter ficado sem essa.

 

Turn it again – Aumenta o ritmo, mas um pouco se definição.. Acaba virando uma boa desculpa para Frusciante solar como desde Mother´s Milk e Blood Sugar não solava.

 

Death of a Martian – Uma balada sem muita expressão, como tantas outras que se amontoam em By The Way. Ao contrário de Júpiter, sepulta Mars sem muita classe.