((petshop ________ a sua ração cultural))


As Torres Gêmeas by Tarcízio Silva
outubro 9, 2006, 11:44 pm
Filed under: Cinema

As Torres Gêmeas, por Tarcízio Silva

Cinco anos: até que demorou pra Hollywood começar a fazer filmes-castástrofe sobre o ataque de 11 de setembro de 2001. Neste ano já foi lançado o Vôo 93, sobre um dos aviões atacados. As Torres Gêmeas (World Trade Center), dirigido por Oliver Stone, conta a história de dois policiais que foram soterrados em um dos desabamentos.

O filme começa bem. Com cara de documentário, vai mostrando cenas de Nova York ao amanhecer. Metrô, ruas ainda vazias e pontos turísticos, como a Estátua da Liberdade ou o World Trade Center mostrando sua magnitude ao fundo de um plano geral imenso. A calmaria antes da tempestade, anunciada quando o letreiro finalmente exibe “Nova York, 11 de setembro de 2001”. Então somos levados para o Departamento da Polícia Portuária de Nova York. A cena em que os policiais são designados para suas tarefas parece existir somente para mostrar o quanto aquela cidade é acolhedora. Os policiais nomeados nesse começo de filme parecem todos vindos de países latinos e Europa Oriental. Um deles é o oficial William J. Jimeno (Michael Peña), que vai contracenar Nicolas Cage. Este é o tenente McLoughlin, o americano comum.

O trunfo do filme é o período em que os dois policiais ficam embaixo dos escombros. A montagem alterna entre os policiais, suas famílias e as equipes de resgate, que não sabem onde estão. Maggie Gyllenhaal interpreta Allison, a esposa do oficial Jimeno. Realiza bem cenas morbidamente constrangedoras, da espera por notícias do marido – ou de sua morte. Mas a família McLoughlin, encabeçada por Donna (Maria Bello) é prejudicada por exageros do roteiro, beirando o sentimentalismo. Por outro lado, as cenas com os policiais são ótimas. Antes quase desconhecidos, tornam-se amigos sob o medo da morte, de nunca mais rever as famílias.

Durante algumas seqüências, fica a dúvida: este drama precisaria mesmo ser no World Trade Center? Apesar das belas seqüências do começo, o fato do desastre pessoal de Jimeno e McLoughlin acontecer no WTC acaba por prejudicar a tensão claustrofóbica criada por Stone. Parece ter sido uma decisão pelo sempre chamativo “Baseado em fatos reais”, ainda mais em algo tão recente.

Algumas cenas alheias ao drama particular dos policiais são exibidas, apesar de inúteis. Pessoas de todo o mundo assistindo às transmissões dos atentados e declarações de George Bush e do ministro da defesa Donald Rumsfeld. Todas elas são estéreis, sem um posicionamento claro. Nem uma abertura interpretativa à la Gus van Sant nem parcialidade escancarada como o Falcão Negro em Perigo, de Ridley Scott. Oliver Stone parece titubear, sem saber o que (pode) dizer.

Escancarado é o sentimentalismo e a supervalorização dos personagens envolvidos no atentado. Como não poderia deixar de faltar, várias cenas exaltam os “heróis americanos”. Por exemplo, quem descobre os policiais nos escombros é um ex-militar religioso (deus e guerra, tudo que o americano gosta), que se infiltra na região dos atentados por puro altruísmo. No final das contas o filme é uma diversão razoável, com alguns bons momentos. Mas não se esqueça de locar Fahrenheit 11/9 no caminho de casa. Certo ou não, Michael Moore soube ser enfático, algo do qual Stone passou longe…



Em Seu Lugar by petcom
outubro 3, 2006, 9:11 pm
Filed under: Cinema

Em Seu Lugar,  por Renata Cerqueira

Por se tratar de uma obra que aborda basicamente as relações humanas, Em seu lugar (In Her Shoes, 2005) não nos parece uma história distante ou deslocada do nosso cotidiano. É um filme que trata de temas que já escutamos de um amigo, que já vimos acontecer com o vizinho e que constantemente bate a nossa própria porta. Sem ficar presa a um caso específico, a trama se constitui em uma condensação de situações, problemas e sentimentos comuns a todos, principalmente àqueles que se relacionam e convivem diretamente com alguém. Embora não caia na superficialidade, o filme peca quando tenta comprimir temas,  tão ricos e diversos entre si, em uma seqüência de encadeamentos que não fazem justiça às possibilidades cinematográficas existentes em cada um deles.

O filme é construído a partir da história de Maggie (Cameron Diaz) e Rose (Toni Collette), duas irmãs que sempre foram muito unidas, embora fossem completamente diferentes uma da outra. Enquanto uma era vaidosa, festiva e irresponsável, a outra era séria, metódica e desleixada com a própria aparência. Com o desenrolar do filme, no entanto, essas diferenças foram compondo um panorama de alegrias, conflitos, descobertas e aprendizados para ambas as personagens. O resultado é um percurso que, embora tenha apelado para alguns estereótipos, foi retratado sem lições de moral, maniqueísmos ou mudanças milagrosas de comportamento.

Sem tirar a importância do diretor Curtis Hanson, muitos dos méritos existentes na obra se devem, na verdade, à Jennifer Weiner. Autora do livro em que o filme foi baseado e um dos grandes destaques norte-americanos na nova Literatura Feminina, Jennifer vem cativando leitores pelo mundo afora. Um dos momentos mais interessantes do filme, por exemplo, é quando a personagem de Cameron Diaz faz uma referência indireta à própria escritora, quando lê um de seus poemas, “One Art”. Enquanto declama os versos e ao som de uma melodia suave, as imagens de Cameron começam a se alternar com cenas de sua irmã, fazendo emergir o forte ar de tristeza inerente à seqüência. Uma cena que, sem contar com interpretações exageradas e diálogos entre as personagens, deixa claro tudo que está emocionalmente se passando naquele instante.

Diante de cenas assim e de temas que variam desde traição e mentira até reencontro e união, torna-se até difícil classificar o filme segundo apenas um gênero cinematográfico. Assim como as nuances presentes na vida humana, Em Seu Lugar se divide em momentos ligados ao drama, à comédia e, até mesmo, ao romance. No entanto, essa alternância de gêneros parece ser empregada aqui com uma dupla função: ao mesmo tempo em que atende à proposta mais realista da obra, ela também funciona como um dispositivo que reclama a atenção do público nos momentos em que a trama começa a se perder. Com uma duração de mais de duas horas e sem bons elos que estimulem a passagem de um desses momentos para o outro, o filme atrai muito mais pela abordagem que se faz de cada situação, sempre muito delicada e sutil, do que pelo tal panorama retratado pela própria obra.



Lovecraft by Tarcízio Silva
outubro 1, 2006, 11:38 pm
Filed under: Quadrinhos

Lovecraft, por Tarcízio Silva

E se as criaturas criadas por Howard Phillips Lovecraft nos contos que mais tarde seriam categorizados por August Derleth como os Mitos de Cthulhu fossem reais? O romance gráfico Lovecraft propõe que o escritor foi perseguido por algumas de “suas” criaturas e os cultistas destas, incomodados pela publicação de seus trabalhos.

H. P. Lovecraft foi um contista de horror do início do século XX. Em seus escritos, a humanidade é irrelevante para o universo. Nos contos da fase chamada Mitos de Cthulhu, foi criada uma mitologia própria: além das divindades ‘verdadeiras’, existiriam algumas criaturas na Terra, os Grandes Antigos, tão poderosos que chegam a ser cultuados como deuses. Antes da humanidade florescer, esses monstros foram banidos e esperam uma oportunidade de reinar novamente. O Necronomicon, um livro mágico maldito, seria a chave para abrir o portal. A premissa da revista é de que este livro realmente existiu, e Lovecraft o recebeu como “herança”.

Adaptado por Keith Giffen, o roteiro de Hans Rodionoff é uma homenagem fundamentada. Fica claro que foi baseado em um amplo trabalho de pesquisa. São identificáveis referências históricas e minúcias biográficas, além da inevitável referência a estruturas narrativas lovecraftianas recorrentes. A introdução escrita pelo cineasta John Carpenter deixa clara a importância do escritor para grandes nomes do horror, como Stephen King e Clive Barker. O próprio Carpenter já homenageou Lovecraft com a premissa e o título original de À Beira da Loucura (em inglês The Mouth of Madness, referência a At The Mountain of Madness).

O horror cósmico criado por H. P. Lovecraft é um desafio para quem queira construir uma representação visual, principalmente se for estática, como no caso dos quadrinhos. Lovecraft construía suas criaturas sempre em termos de inadequação ao mundo e à compreensão humana. A vagueza de descrição era intencional, pois o narrador protagonista não tinha parâmetros de comparação para o “inominável”. O desenhista argentino Enrique Breccia faz um bom trabalho. Seu estilo não é realista, por isso mesmo atinge o objetivo. Os monstros aparecem de forma explícita, apesar disso não ficam banais. Talvez o resultado fosse ainda melhor se o uso de penumbras fosse mais freqüente, mas nada que comprometa a obra.

Alguns detalhes são deleites para os fãs. O desprezo de Lovecraft por seu conto Herbert West: O Reanimador, encomendado pela revista Weird Tales, é mostrado numa conversa com o editor da revista pulp, Edwin Baird. Como não poderia faltar, alguns dos escritores colaboradores de Lovecraft (mais tarde conhecidos como o “círculo lovecraftiano”) aparecem, como Frank Belknap Long e Robert E. Howard. E talvez a melhor das miudezas seja o encontro com o ilusionista Houdini, para quem trabalharia como ghost writer do conto Aprisionado com os Faraós. Atenção também para o papel de Edgar Allan Poe como ídolo e influência para Lovecraft. Apropriadamente uma citação de Poe abre a revista.

Mesmo quem sequer ouviu falar em Lovecraft pode apreciar a revista. Em passagens mais obscuras, notas de rodapé esclarecem o leitor. Se o neófito em Lovecraft não vai sorrir como o fã para cada referência, aos borbotões por página, ao menos vai ser despertado para um autor tão rico, embora ainda sem a fama merecida, setenta anos depois da morte.



Pernambuco nada árido… by petcom
setembro 27, 2006, 3:58 pm
Filed under: Cinema

árido movie

Pernambuco nada árido…, por Gabriel Camões

Movimento “mangue beat”. Quem não conhece com certeza já ouviu falar.  Foi graças a ele que o estado de Pernambuco conquistou o seu lugar de centro da efervescência cultural nordestina. Resgatando facetas esquecidas, porém riquíssimas, da cultura popular do nordeste e aliando esses elementos ao Rock e a música eletrônica, os caras valorizaram a cultura de sua terra e reforçaram a identidade cultural, que hoje é admirada até fora do Brasil.

Nessa vertente caminha o último filme do diretor Lírio Ferreira, “Árido Movie” (Brasil, 2006), um perfeito representante da cultura “mangue” no cinema. Vencedor da categoria “melhor filme” no festival de Pernambuco deste ano, exalta de uma forma bem despojada todos os ícones e elementos que marcam a cultura pernambucana atualmente.

Essa reunião de ícones traduz muito bem o ambiente em que vive a galera do “mangue beat”, e isso se constrói de uma forma muito satisfatória no filme. Em outras palavras, “Árido Movie” tem potencial de se tornar “cult” para um público que se reconhece naqueles diálogos e que se encanta por cada momento da história, embora isso não garanta a perfeição na realização de uma obra.

“Árido Movie”, ao mesmo tempo em que tenta encontrar a fiel reprodução do que significa ser, em 2005, um típico pernambucano de classe média, vivendo na capital nestes padrões e que possui bagagem cultural acima da média, por outro lado busca reproduzir também a permanência de um conservadorismo readaptado nas cidades do interior.

A questão da identidade cultural parece ser o ponto em que Lírio quer dar mais atenção. Embora funcional e eficiente em muitos momentos,  eu acho que isso refletiu num excesso de coloquialismo, no que diz respeito ao uso no filme de expressões características do povo pernambucano. Faltou ao diretor ter a sensibilidade de em alguns momentos aliviar com o “pernambuquês”.
 
A trama em si é muito atraente. O protagonista é uma espécie de retirante bem sucedido. Jonas (Guilherme Weber) trabalha como homem do tempo numa grande emissora de TV em São Paulo. Quando o pai (Paulo César Pereio) que ele não vê desde criança é assassinado na fictícia cidade sertaneja de Rocha, Jonas se vê obrigado a voltar pra Pernambuco para enterrá-lo.

Com a dupla intenção de acompanhar o amigo “paulista” no seu momento difícil (e visitar terrenos férteis de maconha), três amigos de Jonas (Selton Mello, Gustavo Falcão e Mariana Lima), um trio de malucos, caem na estrada (referência clara aos “road movies”) e a partir daí se envolvem em situações das mais loucas, algumas sérias que deverão anular a impressão de que há uma alegre apologia à erva.

Um ponto que não poderia de deixar de mencionar… A atuação de Selton Mello. O ator destaca-se claramente na levada de um texto bastante coloquial e consegue se travestir genuinamente de pernambucano. Ele passeia no texto, encarna uma figura hilária e protagoniza a cena mais engraçada do filme, quando descreve minuciosamente a maneira perfeita de enrolar um baseado.

O filme nos apresenta um painel rico, mas ao que parece ali na tela, um pouco fora de controle. Não parece existir uma seqüência narrativa, o filme se perde e a história segue fragmentada, sem ligação consistente entre os vários núcleos de personagens. Cabe ao espectador sentir se essa fragmentação excessiva é boa ou não para ele e se isso prejudica o ato de apreciação da obra.

Por fim, penso que os vários elementos abarcados no filme e com grau de importância relevante na constituição da obra, como por exemplo, o peso e a força da paisagem árida, a riqueza cultural da capital e interior de Pernambuco e o suscitar da discussão do uso e produção da maconha, poderão fazer de “Árido Movie” um clássico das divergências entre fãs e críticos.



Stadium Arcadium – Muito além do By the way by camiloaggio
setembro 21, 2006, 6:20 pm
Filed under: Música

 Muito Além do By the way, por Camilo O. Aggio

Mais de 25 anos de carreira, 9 álbuns de estúdio gravados, altos e baixos na carreira e um manancial de histórias envolvendo de drogas até o maior rodízio de integrantes da história do Rock fizeram dos Red Hot Chili Peppers uma das bandas mais longevas e importantes do Rock nas últimas duas décadas.

Anos de 2006: os Peppers estão de volta com um feito inédito na carreira: Stadium Arcadium, o primeiro álbum duplo da banda. Para entender  o que esse álbum significa para a carreira dos Peppers, é fundamental saber um pouco da história recente da banda.

Stadium Arcadium é o terceiro álbum da banda depois da volta do guitarrista John Frusciante, sendo precedido por By the way (2002) e Californication (1999). Frusciante foi um dos grandes responsáveis pelos dois maiores e melhores álbuns dos Peppers: Mother´s Milk (1989) e Blood Sugar Sex Magic (1991) (Pra quem não sabe, foi desse álbum que saíram as canções “Give it away” e “Under the Bridge”), sendo o segundo, sem meias palavras, um dos grandes álbuns da história do rock mundial, e responsável por levar os Peppers ao estatuto de celebridades e grandes referências da música pop. Embora tenham criado muitos clichês, os Peppers também foram vítimas de alguns bastante comuns: Frusciante, então com 22 anos, não agüentou o estrelato e o ritmo da turnê do Blood Sugar, em meados de 1992, e resolveu abandonar o barco, deixando os outros integrantes a ver navios no Japão.

Depois da ruptura, as coisas não pararam para nenhum dos dois lados. Enquanto Frusciante se afundava na heroína e fazia álbuns experimentais de gosto bastante duvidoso (principalmente no que diz respeito às letras), os Peppers, depois de muito rodar, contrataram Dave Navarro, ex guitarrista da banda californiana Janes Adiction, e fizeram um álbum quase sofrível: One Hot Minute (1995), que chegou a emplacar o hit Aeroplane nas rádios e na Mtv. Não agradou aos fãs e pelo que parece, nem a banda. Depois de uma pequena turnê, incluindo o Woodstock 2, Dave Navarro abandonou os Peppers , que se viu em um grande dilema, descrito da seguinte forma pelo baixista Flea: “A banda só funcionaria novamente se o John voltasse”. E foi o que aconteceu. John recebeu o convite, passou a tratar da sua dependência pela heroína e se juntou ao grupo. Para a felicidade geral da nação.

Só que a volta não foi lá o que se esperava. Aqueles fãs que estavam sedentos por um novo Blood Sugar Sex Magic tiveram que se contentar com uma “quase outra banda”. Ao invés de “If you have do Ask” e “Funky Monks” os Peppers deram “Scar Tissue” e “Get on top” e ao invés das baladas como  “I could have lied” e “Under the Bridge”, os fãs tiveram que ouvir (arghh!!!) “Otherside” e “Porcelain”. Embora não tenha agradado muitos dois fãs que já acompanhavam a  carreira do grupo, Californication fez com que os Peppers chegassem ao conhecimento de um outro público, mais “pop”, digamos, mais ecléticos, traduzindo: aqueles que dizem que “gostam de tudo”. Mas, para os tenros fãs, Californication só era o prenúncio do fim (da picada), à propósito: By the Way, o oitavo álbum de estúdio do grupo. A banda resolveu extrapolar no poder de compor baladas que matariam um diabético em frações de segundos. By the way, com elementos do Joy Division, podreiras pop dos anos 80, com direito a sintetizadores em algumas faixas, os Peppers fizeram o pior álbum de sua carreira.

Mas, não é a toa que esta banda foi um ícone dos anos 90 e até hoje influencia e é respeitada pela meio musical. Stadium Arcadium é o grande choque que os antigos fãs da banda precisavam para se reanimar. Nesse que é o nono álbum da carreira, composto por dois discos,  Júpiter e Mars, contendo 14 faixas cada um, os Peppers mostram que ainda sabem compor e tocar como nos velhos tempos. Stadium Arcadium não chega a ser um, digamos, álbum à altura do Mother´s Milk, Blood Sugar, ou mesmo Uplift Mofo Party Plan (1987), mas não se cansa de fazer referência a esses trabalhos.

Júpiter, que inclusive tem como faixa de abertura o hit Dani Califórnia, é o melhor dentre os dois. Os Peppers oferecem levadas funk´s não mais como “Get on Top” de Californication, mas como “Backwoods” do Uplift Mofo Party Plan, ou “Apache Rose Peacock” do Blood Sugar sex magic. A cozinha da banda, composta por Chad e Flea retomam os velhos grooves, com linhas pegajosas e poderosas, e John Frusciante, FINALMENTE,  volta a ser um guitarrista, lembrando a “pegada”, os riff´s e solos que tanto caracterizaram seu estilo quando tinha apenas 19 anos e estava entrando para a banda.

Mas não é só de flores que o Stadium Arcadium é composto. Muito das influências tardias trazidas por Frusciante e que entraram com peso nos dois álbuns anteriores da banda, ainda podem ser encontrados nessas novas composições. Mas não sozinhas, e aí que entra a questão: funciona na maioria das vezes. Algumas faixas de Mars, e muitas de Júpiter, intercalam versos e pontes densas, de sonoridades mais “difíceis”, com refrões palatáveis, digno dos anos 80.

Por ser um álbum duplo, com 28 composições, seria difícil que os Peppers fizessem um álbum tão conciso e de rara qualidade como o Blood Sugar Sex Magik. Algumas músicas não funcionam nem como composições solitárias (singles), muito menos como parte do conjunto (álbum), mas Stadium Arcadium tem pelo menos 80% das suas composições com um nível de qualidade que os Peppers não atingiam há mais de 10 anos, e com um vigor que poucas bandas “quarentonas” ainda conseguem manter

Stadium Arcadium é a prova do poder criativo que os Peppers tinham deixado adormecido no processo de composição dos dois últimos álbuns. É também a prova de que estão olhando para trás, para além, muito além do By The Way. Bom para os fãs.

 

 

Faixa por faixa

 

Jupiter

 

 

Dani Califórnia – Boa abertura. Um rock com uma levada típica funk dos Peppers. Tem uma pé nos anos 80, com uma refrão pegajoso e um solo a lá Hendrix.

 

Snow (Hey Oh) – Uma balada do Californication, mas com mais densidade, mais propriedade, com um arranjo mais Rock and Roll

 

Charlie – Inegável a semelhança com o Uplift Mofo . Parece até que o Hillel Slovak apareceu pra fazer os versos e deixou o refrão com o novo Frusciante. Lembra suas antigas influências, como o Funkadelic, com riff´s super reverberados que lembram Maggot Brain.

 

Stadium Arcadium – Balada com melodia meladíssima, lembra refrões oitocentistas. Um pequeno sintetizador por trás, a confuncidiria com uma composição do Erasure

 

Hump de Bump – Os peppers não usam o rap como usaram no Blood sugar. É perceptível que eles tentam chegar no Blood Sugar, mas  Hump the Bump é inevitável comparar com elementos do Hip Hop. A equação: Verso = Funk legítimo; Refrão: quase Black Eyed Peãs. Diverte. Se Beavis estivesse vivo diria: “Essa música me dá vontade de rebolar”.

 

She´s 18  – Uá, uá, Hendrix –– Bom instrumental, porém Kiedis peca na melodia vocal. O instrumental pedia um refrão mais intenso, Kiedis acaba suavizando.

 

Cheeta – Balada, violão de aço que está mais para a última faixa de Californication Road Trippin  do que para I could Have lied. Mais californication do que Blood Sugar. É bonita, tem um refrão condizente com o que a melodia pede, se redime pela faixa acima.

 

Torture me – Doida. Rock impulsivo, uma linha de baixo pesada, com uma guitarra correndo desesperada ao lado. É esquizofrênica, tem um verso punk e um refrão “mais anos 80 impossível”, pontes com trompetes arranhando uma linha meio Ska. A letra é meio piegas, e ainda cita  “nossas crianças brasileiras”:

 

Strip my mind – Frusciante abrindo nos vocais, longe e fazendo sons, ou dizendo algo ininteligível. Solo com notas duplicadas, que lembra uma das bandas dos anos 80 que os Peppers representam no clipe de Dani Califórnia, cafona até não poder mais. A música parece um amontoado de clichês, tudo previsível. Embalada, pronta para beber. Não convence.

 

Michigan – Anthony volta a sua terra natal, com riff´s U2 acompanhando-o nos versos e no refrão. Boa canção, sem muita firúla, que servem como uma boa trilha para Anthony relatar o que observa por Michigan.

 

Warlocks – Base funkiada como pretexto para Kiedis despejar sua letra. Funciona.

 

C´mon girl – Muito agitada, porém nada surpreendente. A música tem uma lógica muita parecida com muitas do Californication, Flea mantém uma linha de baixo frenética ao longo da canção, como em Parallel Universe, com direito a uma risadinha diabólica ao final, algo como Thriller do velho Michael Jackson.

 

Wet Sand – Bonita baladinha. Um pequeno órgão faz um melodia que lembra, muito de longe, Breaking the girl, ao menos na atmosfera. A canção, embora uma baladinha bonita relativamente comum, tem quebradas de ritmo e mudanças de timbre arriscadas, mas bem sucedidas. Convence, é bonita.

 

Hey – Anthony manda bem no vocal, sabendo ser impulsivo e suave conforme a música pede. Frusciante arrisca bem um solo bluseiro, talvez o primeiro dentro dos Peppers, triste como pede o termo, mas com uma pegada hendrexiana. Fecha o primeiro álbum com delicadeza e classe.

 

 

Mars

 

Desecration Smile – Abre com classe o segundo disco. Pela primeira vez em mais de 20 anos de carreira os Peppers compõe uma música com uma referência tão direta às baladas melancólicas do Neil Young. Um pouco do som novecentista de Seattle também pode ser encontrado. Não é à toa…

 

Early Eighties – Verso com levada funk, que faz lembrar um pouco do som do álbum Freak Styley (Álbum dos Peppers de 85,  produzido por George Clinton, mentor do Parliament /Funkadelic) com um refrão importado diretamente do Californication.

 

Hard To Concentrate – Anthony Kiedis adota um tom grave para recitar suas letras por cima de um baixo digno de um The Cure.

 

21st Center – Flea continua lembrando seus velhos baixos que remontam ao auto-intitulado primeiro álbum dos Peppers,  enquanto Kiedis descobre a razão para o século 21……

 

She Looks to Me – Balada fugaz, passa quase despercebida, porém muito fácil de ouvir. Os corações mais moles encontraram amparo nessa faixa.

 

Readymade – Riff de guitarra pesado, seco mas com levada, a lá Tom Morello (Rage against the Machine e Audioslave). Mas, justiça seja feita, Morello veio depois, já inspirado pelos Peppers, mesmo tendo criado um estilo…

A faixa funde momentos bastante distintos, ora lembrando Led Zeppelin, ora Nirvana…os Peppers exercitam seu pode de fusão. Marca que os registrou no mundo da música.

 

If  Sem definição. Uma balada que quebra o ritmo que o disco vinha definindo. Poderia ter ficado no “se” mesmo….

 

Made you feel Better – Imaginem uma canção punk rock. Agora diminua a velocidade dessa canção, depois pare bem na entrada do New wave, não avance a porta: Essa é Made you feel Better.

 

Animal Bar – Ao contrário de If, esta balada tem função estrutural. Serve como uma boa ponte. Não quebra o percurso do disco.

 

So much i – Anthony Kiedis toma as rédeas nesta faixa e faz uma melodia vocal até melhor do que a  canção pedia. A empolgação do vocalista dos Peppers é imperdível.

 

Storm in a teacup – Funk poderoso com uma refrão The  Breeders. Longe de ser uma um mísero “storm in a teacup”

 

We Believe – Guittarras que lembram Santana na sua fase (nada boa) atual. Mars poderia ter ficado sem essa.

 

Turn it again – Aumenta o ritmo, mas um pouco se definição.. Acaba virando uma boa desculpa para Frusciante solar como desde Mother´s Milk e Blood Sugar não solava.

 

Death of a Martian – Uma balada sem muita expressão, como tantas outras que se amontoam em By The Way. Ao contrário de Júpiter, sepulta Mars sem muita classe.

 

 

 

 

 



Eu vi uma comédia romântica e tinha uma terapeuta nela!, por Thiago Felix by petcom
setembro 17, 2006, 12:55 pm
Filed under: Cinema

Eu vi uma comédia romântica e tinha uma terapeuta nela!, por Thiago Félix

Não deve existir mais ninguém que fique realmente empolgado com a idéia de assistir a “mais uma comédia romântica americana” (principalmente se ela tiver um título tão desgraçadamente brega quanto “Terapia do Amor”). Para minha surpresa, lá estava eu na locadora prestes a levar para casa um exemplar deste, que para mim, é um novíssimo sabor de enlatado americano.

 

Lá vai a história: uma mulher de trinta e poucos anos recém separada, busca na terapia o alívio para sua perda, com o passar do tempo ela se envolve com um homem mais novo, algo em que sua terapeuta a apóia. Tanto a terapia quanto o relacionamento vão muito bem até que se descobre que a terapeuta e o namorado são mãe e filho (!) (pequeno parêntese, sinceramente não sei quem, em Hollywood, paga as pessoas pra ter este tipo de idéia, mas sei que essas mesmas pessoas tiveram a sacada de contratar Mary Streep para o papel da terapeuta, e a tarantinesca Uma Turman para protagonizar o filme, em que volta e meia fala coisas do tipo: “Você tem 22 anos? Eu tenho camisetas mais velhas que você!” ).

 

Não obstante o fato de a circunstância já ser, por si só, o samba do crioulo doido, eles ainda temperam a trama com o preconceito da família do rapaz por ela não ser judia, e o fato de ele ser um pintor em início de carreira, infantil e sem dinheiro. Esta aparente carência de curadoria empresta verossimilhança com os problemas da vida real, certa profundidade aos personagens e até algum charme a eles.

 

Não sei se é pela falta de familiaridade, mas o filme parece um pouco longo, já que os roteiristas não economizaram nas idas e vindas do casal. Diferente do que se costuma ver, eles não são “loucos-apaixonados-pra-vida-inteira”, sempre prontos pra se jogar da ponte se o outro não gostar do mesmo sabor de sorvete.  Os personagens inclusive ficam indecisos, sem saber se o namoro ultrapassará a barreira do sexo casual para se tornar um problema definitivo na vida dos três.

 

O filme ainda tem o trunfo de se ambientar em Manhatan e fica se aproveitando disso para esboçar aquela atmosfera maravilhosa dos filmes de Woody Allen; o que ,convenhamos, é bastante bom. A personagem da Uma Turman é bastante culta, trabalha com moda e namora um pintor, óbvio que isso é uma porta aberta para algumas de referências que vão de Freud a John Coltrane. O filme tem ainda ótimos figurinos para a ótima atriz, que está linda e que na época estrelava a campanha de uma famosa grife de roupas. Ainda no capítulo moda repare na aparição relâmpago de ninguém menos que Tom Ford, um dos maiores nomes do mundo da moda, que aparece quase furtivamente.

 

Terapia do amor, que originalmente se chama Prime, surpreende pela abordagem do universo feminino, por ser mais inteligente que a maioria, por trazer um ótimo humor, pelas boas atuações, pela trilha sincera e por economizar no happy end… Mas ainda tem bastante da graça dos estúdios especialistas em explodir o mundo.



Premonição 3, por Carol Neves by petcom
setembro 17, 2006, 12:53 pm
Filed under: Cinema

Premonição 3, por Carol Neves

Premonição é um filme atípico; como um filme que tem o mesmo mote de seus predecessores continua a interessar o público, fazer sucesso e mantém a franquia viva? Ao contrário de filmes de terror adolescentes com os quais guarda certa similaridade, como Pânico ou Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado, Premonição não se preocupa especialmente com a continuidade; os filmes da série não têm necessidade de continuar de um ponto específico e sempre começam do zero, embora ocorra ocasionalmente uma menção a fatos ocorridos anteriormente.

 

O que não muda no filme são os pressupostos: o filme começa, alguém tem uma premonição em algum lugar que proporcione situações de tensão (no primeiro foi um avião, no segundo uma rodovia), metade dos personagens consegue se esquivar da morte, metade morre. As “regras do jogo” todos sabem: a morte vai atrás daqueles que sobreviveram, na ordem que eles deveriam ter morrido originalmente, e mesmo que alguém consiga driblar a morte, isso não passa de um adiamento, pois ela sempre volta…

 

Este terceiro filme traz um pequeno adicional em relação ao material original que é o fato de fotos tiradas no dia do acidente revelarem a maneira como cada um vai morrer. Sim, tem muitas fotos – provavelmente um recurso de merchandising, já que a marca da câmera aparece a todo momento e a primeira meia hora do filme parece ser gasta só com isso.

 

O ambiente escolhido dessa vez foi o parque de diversões, que acaba se revelando muito óbvio. De maneira nada sutil, surgem imagens de diabos gigantescos, trem fantasma, ao som de músicas “de tensão”.

 

OK, ao filme, então.

 

Os piores atores entre os três Premonição (tanto no quesito atuação quanto na falta de carisma), diálogos sofríveis, roteiro confuso por conta daquela historinha das fotos, que acaba sendo muito forçada. Sim, eles conseguiram deixar furos num roteiro de algo tão simples quanto “ser perseguido pela morte e morrer”.

 

Mas não é tão ruim quanto parece – ou talvez seja, e daí a graça. O filme entra, sim, na categoria daqueles que de tão ruins você se diverte vendo. Os diálogos nonsense (como as duas patricinhas do colégio, que dias depois do acidente que matou metade da classe de formando vão se bronzear “em homenagem aos colegas”) acabam dando certa graça ao filme, embora às vezes eles sejam apenas ruins de doer mesmo.

 

Enfim, permanece aquele que é o grande motivo para os filmes Premonição continuarem vivos: a curiosidade mórbida para ver como os personagens vão morrer. Esse filme não tem aquela tensão a la Pânico de “será que ele mata a Sydney?”. Não, você sabe que todos vão morrer e só resta sentar na cadeira, caprichar na pipoca e conferir a criatividade dos roteiristas dessa vez – no caso desse terceiro filme, média, com algumas mortes muito insignificantes e repentinas e umas deliciosamente cruéis. Acaba valendo a pena.



A Torre Negra by untitled2
setembro 11, 2006, 4:31 pm
Filed under: Literatura

O Pistoleiro

A TORRE NEGRA, por João Barreto 

A Torre Negra é uma série em sete volumes que traz Roland Deschain, o pistoleiro, mais precisamente o último pistoleiro. Descendente do clã de Gilead, um espécie de feudo, e representante de uma linhagem de implacáveis, desaparecida desde que o Mundo Médio seguiu adiante. Para evitar a completa destruição desse mundo e de mundos agregados, Roland precisa alcançar a Torre Negra, eixo do qual depende todo o tempo e todo o espaço. O Mundo Médio, será descoberto adiante, apresenta inquietantes semelhanças com a nossa própria realidade.

O primeiro romance do escritor norte-americano Stephen King foi escrito ainda nos anos setenta: “Carrie”. Logo após publicado, tornou-se sucesso e foi imediatamente adaptado para o cinema. “O Pistoleiro” veio logo em seguida a “Carrie”, em 1978, mas só agora recebe versão brasileira. “O Pistoleiro” é o primeiro volume dessa obra maior, “A Torre Negra”, e cujo quinto volume chegou recentemente às prateleiras das livrarias nacionais pela editora Objetiva, que publica King hoje no Brasil. A partir de “O Pistoleiro”, os outros títulos da série são, em sequência, “A Escolha dos Três”, “As Terras Devastadas”, “Mago e Vidro” e a mais recente “Lobos de Calla”. A série já estava terminada quando o escritor se aposentou embora permanecesse inédita nas terras de cá.

Stephen King admite ter bebido de diversas fontes ao pensar uma obra tão extensa e grandiosa que poderia ser equiparada, segundo ele, ao Senhor dos Anéis enquanto épico. Parafraseando o próprio autor, se é muito ambicioso aos dezenove anos de idade, que foi quando começou a conceber a série “A Torre Negra”. Inspirado também nas lendas do Rei Arthur e da Távola Redonda, a narrativa apresenta sinais de intertextualidade com outros romances do autor, coisa que já havia feito antes em obras como, “Insônia”, “A Coisa” e a coletânea de contos “Four Past Midnight”. É imagética e escrita no estilo particular de King, com gírias americanas, comparações vulgares e expressões às quais o seu público já está acostumado. Tudo muito coloquial e cheio de flashbacks.

É interessante acompanhar a progressão estilística de King através dos livros, uma vez que foram escritos no decorrer de sua carreira literária, com os seus maiores defeitos e as suas maiores qualidades. A narrativa, embora muito extensa em determinadas cenas, é empolgante e não necessariamente de horror, pendendo mais para o fantástico, assumindo diversos mundos possíveis etc. O cenário pós-apocalíptico do Mundo Médio, onde a maior parte da narrativa se desenrola, se abre em possibilidades e lança referências a várias décadas do nosso próprio mundo real. Tempo e espaço trocam de papel durante a saga e os personagens vão sendo manipulados como marionetes na roda da fortuna que o argumento da obra chama de ka-tet, o que determinaria o destino deles todos e dos mundos que estão tentando salvar.

“A Torre Negra” é certamente muito extenso, e é certamente também épico, mas eu hesitaria em comparar com “O Senhor dos Anéis”, clássico até agora inigualável, dentro da sua própria proposta, da literatura de língua inglesa. Talvez “A Torre Negra” não agrade aos fãs de King que preferem o horror propriamente dito na sua literatura. Isso porque “A Torre Negra” reúne romance e aventura, suspense e ficção científica e é uma boa diversão pra quem tem o fôlego suficiente para atravessar todos os sete volumes mas não é estritamente uma obra de horror. É bom para quem gosta de se imaginar em mundos possíveis.



STOP by petcom
setembro 6, 2006, 3:40 pm
Filed under: Cinema

 

              STOP   por Nina Atalla

Não há dúvida de que toda história tem uma moral. O lugar onde ela se encontra é que difere. Pessoalmente, se a história não envolver uma raposa e uma lebre, me causa certo receio quando a moral serve para tematizar a narrativa, vira moralismo, verdade fácil. É o que acontece com o filme “Click”. Adam Sandler, fazendo papel de “Adam Sandler”, é um cara que se sente oprimido diante da vida.

Dividido entre a família e o trabalho, o esforço nunca parece suficiente para que as coisas fiquem equilibradas nos dois setores. Como todo mundo, o personagem fantasia com uma solução milagrosa para seus problemas, gostaria de ter um controle maior sob seu tempo e sob as circunstâncias, conflito moderno básico. Daí, surge o mote do filme.

Numa introdução bizarra do motivo, o personagem ficar irritado porque não consegue nem ligar a TV, em meio a tantos aparelhos eletrônicos, fica difícil saber qual controle remoto serve para cada apetrecho tecnológico. Desiludido com a dificuldade de executar as coisas mais rotineiras, ele decide comprar um controle remoto geral. Mas ao chegar na loja se depara com um controle que não apenas serviria para ligar e desligar aparelhos eletrônicos, mas também para dirigir certas situações da vida.

O controle remoto geral pode ser usado para congelar ou acelerar o tempo, ver cenas passadas da vida presencialmente e, até para dar “mute” na esposa que reclama. Admirado com o poder de interferir em aspectos antes impensados, o personagem começa a acelerar as situações que lhe pareciam penosas. O problema é que o controle se auto-programa e começa a repetir os padrões de escolha do personagem involuntariamente. Quando ele acelera o tempo para ganhar uma promoção, por exemplo, dá margem para que todas as outras vezes que ele estiver prestes a subir na empresa, os meses passem rápido. Assim, ele vai perdendo boa parte da vida.

O problema do argumento do filme, que se propõe a discutir modos de vida, é não prestigiar as nuances do cotidiano. Só existem dois momentos, o que você está entediado e o que está extraordinariamente feliz, uma espécie de epifania do cotidiano. Todos sabemos que o segundo não existe, e você fica se sentindo subestimado por um filme que se utiliza de um motivo bizarro para dizer que esse não é apenas um problema seu, mas de toda a sociedade ocidental.

Eu entendo que há momentos em que realmente esquecemos um pouco disso, mas no fundo todos sabemos, a não ser que seja o caso de uma doença depressiva. Além do mais, o filme se estende no melodrama. Há cenas bastante apelativas e, até bregas. Aquela coisa do cinemão americano, que quer te enfiar pela goela algum tipo de sentimento. E isso, é o pior do filme, porque até aí, nada demais. Eu fui lá sem esperar uma argumentação bem construída mesmo, para ouvir umas piadas, que ora são inteligentes, ora de mal gosto, normal. Mas sentimentalismo barato, por sentimentalismo barato, eu fico com a Camilinha hemofílica do Manoel Carlos, não preciso sair de casa, não gasto dinheiro, e ainda por cima, se eu me sentir eventualmente brega, posso chorar no esconderijo do meu lar. Tudo isso dá um pouco de raiva, mas ponderando um pouco,  “Click” não é um filme que te deixa muito entediado.

Você fica lá embasbacado, pelo menos isso. Mas daí a fazer como a professora de literatura de uma amiga minha, que disse “ Nossa, esse filme é uma lição de vida”, já é demais. Licões de Vida me cansam imensamente, na verdade. Sou mais da ironia, do desconcerto e da surpresa. Outro tipo de moral…